Um marco na estrada,
Um gesto que se faz.
Uma palavra que se diz
E ergue-se o meu país.
É um barco no mar,
Uma varina a chorar.
É uma sopa e o conduto
E uma velhinha vestida de luto.
É um homem que parte.
É a vertigem da arte.
É um pão sobre a mesa,
É mais dúvida que certeza.
É uma capela e um sino,
Uma bandeira e um hino.
E é a saudade!
É uma guitarra a chorar um fado,
Um povo trabalhador e honrado.
E é a distância.
O passo certo da errância
E da solidão.
O meu país é uma canção.
Nascem na pena de um poeta
Versos de esperança e futuro.
Mas o horizonte e a meta
Estão para lá do muro.
A semente secou e morreu
Num ventre prenhe de vida.
O meu país pereceu
Às mãos de uma arma fingida.
Houve homens altos
Que ergueram uma capela no Índico
E uma fortaleza perdida.
Houve homens que foram lá longe
Onde começa o mundo,
No outro extremo desse poço sem fundo
De palavras e dizeres.
Houve homens que levantaram âncoras
De morte e suor.
E também houve feitos épicos
E vorazes epopeias.
O meu país é um deserto de ideias!
Passa uma criança com fome
E um doente abandonado,
Passa um velho triste
E um político num fato engomado.
Passa um avião
Rasando as casas da cidade,
Lá dentro vai a desilusão
Num corpo sem idade.
Passa um povo traído
E não há quem o console,
Vive entregue ao capricho sinuoso
De uma bola de futebol.
Vai desfilando angústia e desespero
Na passadeira da história.
Meu país é um povo sem memória!
E de manhã, ao acordar,
Sente-se um perfume no ar,
Um vento de insuspeita mudança,
Um grasnar na praia,
Um rumor de sentença,
Uma música na rádio,
Uma correria de rua,
Uma bandeira desfraldada,
Uma mulher semi-nua.
Um gritar entusiasmado,
Uma cidade em alvoroço,
Um refrão mal rimado
Em verbo curto e grosso.
Um punho no ar,
Um cartaz na mão.
Portugal é um país
Em constante revolução!
jpv
11/06/2014 às 00:05
Parabéns, meu amigo. Num tempo de vazio em que o próprio esvaziamento das palavras é tal real e magoado, as tuas palavras, pela exceção, preenchem, transportando a plenitude e a essência…obrigada.
Maria Augusta Torcato
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11/06/2014 às 00:26
Muito obrigado! Sempre generosa e simpática comigo. É preciso acreditar sempre. E é preciso usar a palavra! jpv
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